quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Crítica: Animais Fantásticos e Onde Habitam (2016)













Dirigido por: David Yates. Roteiro de: J.K. Rowling. Produzido por: David Heyman, J.K. Rowling, Steve Kloves, Lionel Wigram. Estrelando: Eddie Redmayne, Katherine Waterston, Dan Fogler, Ezra Miller, Jon Voight, Colin Farrell.

Entre 2001 e 2011, a série Harry Potter mostrou-se um verdadeiro milagre no esquema de produção de Hollywood. A consistência e qualidade crescente das produções rivalizava apenas com a engenhosidade do universo concebido por J.K. Rowling. Durante a série, os intrincados detalhes daquele universo, aliados a uma boa história, culminaram numa franquia que marcou uma geração, de forma semelhante à primeira trilogia de Star Wars.

Animais Fantásticos e Onde Habitam se passa em 1926, 65 anos antes dos eventos de A Pedra Filosofal, que, ao contrário do que alguns afirmam, não se passa na contemporaneidade e sim em 1991. Roteirizado pela própria Rowling, o longa inicia-se com a chegada de Newt Scamander (Redmayne) a Nova York. Após acidentalmente trocar sua pasta, repleta de criaturas mágicas cuja posse é proibida nos EUA, com Jacob Kowalski (Fogler), um sujeito boa-praça que sonha em ter sua própria padaria, Scamander vê-se envolvido numa missão para recapturar os animais, bem como provar que a ameaça que ronda a cidade é de origem humana, não animal.

Beneficiado por um elenco bem escalado que confere autenticidade a personagens que, mesmo que por vezes unidimensionais, nunca falham em cativar o espectador, Animais Fantásticos é habitado por figuras como o gentil Kowalski, que serve como ponte entre o espectador e aquele universo ao reagir maravilhado a cada momento mágico, além de acertar por se manter longe do arquétipo homem-gordo-engraçado. A dinâmica entre as belas irmãs Tina (Waterston) e Queenie (Sudol) é tão eficaz quanto seus figurinos. Enquanto Tina veste calças e tons cinzentos que ilustram sua natureza pragmática e moderna, Queenie está sempre de rosa, o que juntamente com o olhar inocente e sedutor empregado na composição cuidadosa de Sudol, cria um vínculo instantâneo com o espectador. Já Ezra Miller, que parece ter se especializado em interpretar tipos deslocados, apresenta uma performance comovente como o perturbado Credence, em alguns momentos remetendo à sua atuação em Precisamos Falar Sobre o Kevin.

Conforme esperado, Animais Fantásticos impressiona particularmente em seu design de produção. Desde a imponente sede da MACUSA (espécie de Ministério da Magia norte-americano), até os diversos hábitats contidos na bolsa de Scamander, a direção de arte se mostra atenta a detalhes, contrapondo a paleta acinzentada das ruas de uma Nova York sempre nublada com as cores alegres do interior da maleta do zoólogo. Os animais vistos ao longo da projeção fazem jus ao adjetivo dado no título, desde o ousado Pelúcio até o simpático Tronquilho, passando por velhos conhecidos, como os Grindylows vistos em O Cálice de Fogo. Espectadores mais atentos notarão a participação do pássaro dodô, ave endêmica da Ilha Maurício vista pela última vez em 1662, que no universo de Rowling tem a capacidade de desaparecer e reaparecer em outros locais (talvez por isso os trouxas a considerem extinta).

Como em todo longa de alto orçamento com uso massivo de computação gráfica, os efeitos são normalmente eficientes, embora tropecem em um ou outro momento. A maioria das criaturas vistas é de uma solidez palpável, movimentando-se e reagindo de forma absolutamente natural a toques e fontes de luz. Já o goblin interpretado por Ron Perlman é de uma artificialidade patente, e por um breve momento fui jogado para fora do filme e só consegui pensar “que CGI ruim!”. Uma coisa é criar o impossível por meios digitais, outra é insistir em usá-los para fazer o perfeitamente alcançável por meios reais. Assim como Peter Jackson substituiu os orcs de O Senhor dos Anéis por similares digitais em O Hobbit, parece que David Yates seguiu o exemplo do diretor neozelandês, abrindo mão dos convincentes goblins vistos em Harry Potter e investindo em toscas imitações binárias. O 3D (convertido) é envolvente, utilizando a profundidade de maneira inteligente e orgânica, pecando apenas por escurecer ainda mais um filme cuja fotografia já é naturalmente sombria.

Felizmente, J.K. Rowling revela-se uma roteirista cuidadosa, criando um equilíbrio perfeito entre melancolia e encantamento, bem como alertando os espectadores de todas as idades sobre a dor de ocultar a própria natureza. Em última instância, Animais Fantásticos reconhece que repressão, intolerância e preconceito só podem levar à destruição e ao sofrimento, mensagem que não poderia ser mais atual.

Ligeiramente voltado para um público um pouco mais maduro do que aquele que acompanhou a saga Harry Potter, este novo projeto investe na força de suas imagens e no carisma de seus personagens, renovando nosso vínculo com esse universo tão querido. Dessa forma, inicia-se uma nova franquia que tem tudo para repetir o feito da anterior, levando crianças e adultos numa jornada irresistível.

Por Bernardo Argollo

Agradecimentos: Espaço Z e Warner Bros. Pictures.

terça-feira, 7 de junho de 2016

Crítica: Invocação do Mal 2 (2016)













Dirigido por: James Wan. Roteiro de: James Wan, Chad Hayes, Carey Hayes. Produzido por: Peter Safran, Rob Cowan. Estrelando: Vera Farmiga, Patrick Wilson, Frances O’Connor.

Em 2013, o malaio James Wan surpreendeu com seu Invocação do Mal. Baseado em fatos reais, o longa conquistou o público e a crítica com seu roteiro envolvente, boas atuações e tom angustiante. Eis que, ao contrário de filmes como Pânico e Atividade Paranormal, que deram origem a sequências pavorosas, esta continuação da história do casal Ed e Lorraine Warren prova que continuações de terror podem, sim, fazer jus à obra original.

O roteiro acompanha mais um caso documentado pelo demonologista Ed Warren e sua esposa, a médium Lorraine. Num bairro humilde no subúrbio de Londres, a família Hodgson percebe que está sendo atormentada por algum espírito malévolo, e então os protagonistas, que já enfrentam seus próprios dilemas, são convocados pela Igreja para investigar. Inteligentemente e sem precipitações, a narrativa começa explorando nossos medos mais primitivos (escuro, desconhecido, sons inexplicáveis) e daí partindo para ameaças mais palpáveis.

É aí que começam os acertos do roteiro que, escrito a oito mãos (o que nunca é um bom sinal), evita situações do tipo “ninguém-acredita-no-que-a-criança-diz” ou ainda “meus-amigos-pensam-que-estou-louco”, comuns em filmes do gênero. Assim, a mãe interpretada por Frances O’Connor não demora a aceitar como verdadeiros os acontecimentos que se desenrolam em sua casa, o que só ajuda a empurrar a narrativa para frente. Curiosamente coeso para um roteiro que carrega visões claramente distintas, apenas algumas passagens soam deslocadas, como os planos inseridos para mostrar a situação econômica do Reino Unido dos anos 1970.

É sempre louvável quando um filme de terror encontra tempo para o desenvolvimento dos personagens e da dinâmica entre eles, o que, em última análise, contribui para a identificação do espectador e fortalece a atmosfera do filme. Não deixamos, portanto, de torcer por aquelas figuras por um momento sequer e o temor por seus destinos tem uma intensidade louvável. Assim, Wan inclui cenas tocantes e de beleza triste, como a versão improvisada de “Can’t Help Falling in Love”, de Elvis Presley. O longa ainda encontra tempo para uma inspirada gag física envolvendo o excesso de peso de um personagem, ainda que o riso involuntário seja logo substituído por um suspiro de preocupação.

É notável a segurança com que Wan conduz o projeto, e seu esmero técnico fica patente em diversos momentos, como no complexo plano sem cortes que acompanha o percurso dos personagens na residência dos Hodgson. A fotografia, ainda que óbvia, merece aplausos por mergulhar a casa da família em sombras sem torná-la excessivamente escura. A trilha sonora, ainda que caia no clichê dos acordes altos em momentos-chave, consegue ser eficiente, ao comentar a narrativa sem tentar guiá-la. Já os efeitos visuais são bastante eficientes, sem cair no cartunesco ou no excesso de CGI.

Vera Farmiga e Patrick Wilson exibem uma química em cena ainda melhor do que no filme anterior, e Madison Wolfe, a jovem atriz que interpreta Janet, a moradora mais afetada pela presença demoníaca, chama atenção por sua expressividade.

Assim como o excelente The Babadook (2014), Invocação é um longa aposta numa atmosfera ameaçadora e sombria em detrimento de simples sustos. Juntando-se ao primeiro filme como belo exemplar do gênero terror, Invocação do Mal 2 é um daqueles filmes que leva o espectador recém-saído do cinema a refletir sobre o que acabou de assistir. Afinal de contas, não é para isso que o Cinema serve?

Por Bernardo Argollo

Agradecimentos: Espaço Z, Warner Bros. Pictures e New Line Cinema.

quarta-feira, 1 de junho de 2016

Crítica: Warcraft (2016)













Dirigido por: Duncan Jones. Roteiro de: Duncan Jones, Charles Leavitt. Produzido por: Thomas Tull, Jon Jashni. Estrelando: Travis Fimmel, Ben Foster, Paula Patton, Dominic Cooper, Toby Kebbell.

Eis que, quase uma década depois de começar a ser idealizado, Warcraft – O Primeiro Encontro de Dois Mundos, sai do papel. Tendo dado origem a quadrinhos, livros e outros derivados, World of Warcraft é uma bem-sucedida série de videogames que, apostando num universo fantasioso ao mesmo tempo original e familiar, conquistou legiões de fãs e o interesse de hollywood ao longo de vinte e dois anos. O resultado foi, no mínimo, irregular.

Dirigido pelo novato Duncan Jones, o filme se passa no universo fantástico de Azeroth, concentrando sua narrativa sob a perspectiva do orc Durotan (Kebbell), que luta para proteger sua família e de Lothar (Fimmel), general humano que também visa defender seu povo. A trama cobre basicamente os eventos iniciais do jogo, mostrando como começou a rivalidade entre as diversas raças.

É justamente aí que reside o maior problema do projeto que, ávido para agradar aos fãs, simplesmente vomita conceitos sem o devido desenvolvimento. Dessa forma, o espectador que não teve nenhum tipo de contato com o material fonte terá sérias dificuldades em entender as regras e vicissitudes daquele universo, o que é totalmente absurdo, já que uma obra cinematográfica deve se sustentar por si mesma. Assim como as fãs da “saga” Crepúsculo, que argumentavam dizendo que “não gostou do filme porque não leu o livro”, certamente fãs do videogame dirão que “não gostou porque não jogou”. Assim como Cinema não é literatura, também não é videogame. Novos tempos, velhos dilemas...

As figuras ali presentes, contudo, são razoavelmente interessantes e conseguem sustentar o projeto. Não duvidamos por um momento sequer da dedicação de Durotan à sua família, assim como o conflito interno da orquisa Garona (Patton) nunca deixa de soar convincente. É uma pena que Travis Fimmel, ator que, de um modo geral, admiro, apresente uma composição absolutamente idêntica à que usa no Ragnar Lothbrok da série Vikings, o que só limita o potencial dramático do personagem. Os demais personagens são unidimensionais e, portanto, jamais tememos pelos seus destinos. A morte de certo soldado, cuja identidade não revelarei, deveria ter forte impacto emocional, mas acaba sendo inócua.

Visualmente impressionante como esperado, o longa investe em cenários grandiosos - meu favorito é o prédio inspirado na Basílica de Santa Sofia - e figurinos eficientes, embora excessivamente artificiais. Como todo projeto que depende pesadamente de CGI, os efeitos visuais ora são convincentes, ora cartunescos. Assim, cenas de ação carecem de fisicalidade e alguns personagens incomodam pelos olhos sem vida, comuns em criaturas digitais. Como algumas delas remetiam a Labirinto (1986), não deixa de ser interessante especular o que o mestre Jim Henson seria capaz de fazer com um projeto desses.

A fotografia investe em cores marcantes, que se contrapõem à tonalidade sombria presente em quase todos os épicos de fantasia. A versão 3D (convertida) é razoável, com boa profundidade e sem cometer o pavoroso erro de atirar objetos em direção ao espectador. O diretor de fotografia Simon Duggan, porém, utiliza recursos adequados somente ao 2D, como a mudança brusca de foco e profundidade de campo mínima.

Deixando diversas pontas soltas, que deverão ser amarradas em possíveis continuações (como o preguiçoso subtítulo prenuncia), Warcraft é suficientemente eficaz para agradar o espectador casual e ainda mais os fãs do jogo. Mesmo assim, acaba se parecendo demais com o que realmente é, um Senhor dos Anéis água-com-açúcar e bem menos envolvente. A comparação pode ser injusta, talvez, mas é derradeira e inevitável.

Por Bernardo Argollo

Agradecimentos: Espaço Z e Universal Pictures.

terça-feira, 17 de maio de 2016

Crítica: X-Men - Apocalipse (2016)













Dirigido por: Bryan Singer. Roteiro de: Simon Kinberg. Produzido por: Lauren Shuler Donner, Simon Kinberg, Bryan Singer Estrelando: James McAvoy, Michael Fassbender, Jennifer Lawrence, Nicholas Hoult.

A franquia X-Men foi, ao longo de dezesseis anos, merecidamente reconhecida como referência no que diz respeito a filmes de super-heróis. Sem sacrificar a história em detrimento da ação, os filmes da franquia se arriscam tematicamente sem deixar de ter apelo comercial.

Dez anos após os acontecimentos vistos em Dias de Um Futuro Esquecido, o roteiro acompanha as versões mais jovens dos mutantes, quando o trio Magneto (Fassbender), Mística (Lawrence) e Xavier (McAvoy) se reúnem novamente para enfrentar o mutante Apocalipse (Isaac). Mais antigo dos mutantes, Apocalipse foi reverenciado como um deus no Egito Antigo e agora, decepcionado com a humanidade, decide eliminá-la.

Extremamente parecido com o Ronan de Guardiões da Galáxia (a comparação é inevitável), Apocalipse utiliza maquiagem e figurino pesados que não permitem que apreciemos as nuances da atuação do ótimo Oscar Isaac. Além disso, a voz alterada digitalmente o fez soar como um vilão genérico, do tipo que já pôde ser visto em uns dez filmes.

No elenco mais jovem, os destaques ficam por conta de Sophie Turner, Jennifer Lawrence e Nicholas Hoult, que conseguem transmitir com um olhar o que muitos de seus colegas precisariam de diálogos para passar. McAvoy e Fassbender estão no piloto automático, este último prejudicado por repetir o arco dramático do tipo erro-queda-redenção que já se tornou marca de seu personagem em quase todos os filmes da franquia. O onipresente Wolverine (Jackman), é reduzido a uma simples ponta. Ademais, o roteiro incomoda pelo excesso de diálogos constrangedoramente expositivos, mas isso é um pecadilho diante da qualidade do elenco.

Visualmente impressionante como esperado, o longa investe numa fotografia dessaturada que evidencia o clima de tensão dos personagens, ao passo que aqui e ali o espectador atento notará dicas visuais do que irá acontecer a seguir, como a camiseta roxa que o Prof. Xavier utiliza em certo momento, por exemplo. As cenas de ação são bem coreografadas, com destaque para a engenhosa sequência envolvendo Mercúrio (Peters).

Felizmente, Apocalipse consegue retratar o clima dos anos 1980 sem apelar para o cafona ou fazer referências excessivas. A música do período é utilizada brilhantemente e a piada envolvendo Retorno de Jedi  (“o terceiro filme é sempre o pior”) foi simplesmente hilária. Além de alfinetar um filme da própria franquia, momentos como esse mostram que Bryan Singer sabe ser inteligente sem se levar a sério demais.

É uma pena que, no terceiro ato, uma franquia que sempre apostou na riqueza de suas ideias e subtextos em detrimento do puro entretenimento acabe se rendendo a uma simples luta do bem contra o mal, que culmina numa resolução apressada que não faz jus aos dois primeiros atos. Ainda assim, o projeto se solidifica como um forte entretenimento, em um ano lotado de adaptações de quadrinhos. Resta-nos torcer para que Bryan Singer continue a injetar energia nessa franquia (talvez a única do gênero) que nunca apresentou motivos reais para decepções.

OBS.: há uma cena pós-créditos.

OBS2.: a versão em 3D é bem pensada, mas acaba por escurecer um filme cuja fotografia já tende ao acinzentado.

Por Bernardo Argollo

Agradecimentos: Espaço Z e 20th Century Fox.

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