quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Crítica: Era Uma Vez no Oeste (1968)













What are we going to do with this one, Frank?
Título original: C'era una volta il West. Dirigido por: Sergio Leone. Produzido por: Fulvio Mosella, Bino Cicogna. Roteiro de: Sergio Donati, Sergio Leone. Montado por: Nino Baragli. Fotografia de: Tonino Delli Colli. Música de: Ennio Morricone. Estrelando: Claudia Cardinale, Henry Fonda, Jason Robards, Charles Bronson.

De modo a aproveitar o sucesso dos filmes western americanos, que estavam em baixa na década de 1960, o cinema europeu produziu uma obra única. Fazendo parte do gênero conhecido como western spaghetti, como são chamados os filmes desse tipo realizados por diretores italianos, Era Uma Vez no Oeste hoje é aclamado como um dos maiores filmes de todos os tempos e como o melhor do seu segmento. Houve um erro na tradução do título em italiano para o inglês e, posteriormente, para o português. O título original significa “Era Uma Vez o Oeste”, isto é, o fim do Oeste como era conhecido através da chegada do progresso.

Com pouco diálogo e muita tensão, o filme acompanha quatro personagens pricipais: o bandido Cheyenne, a ex-prostituta Jill McBain, o matador de aluguel Frank e um homem misterioso que sempre carrega uma gaita. Os quatro acabam se cruzando quando um barão ferroviário contrata Frank para matar Brett McBain, dono de terras que valorizar-se-iam com a chegada da ferrovia. A produção foi rodada no deserto de Almeria, na Espanha, no deserto de Utah e nos famosos estúdios Cinecittà (os interiores), na Itália (mesmo local onde foram gravadas produções como Ben-Hur, Cleópatra e o recente seriado Roma, da HBO).


Dono de um estilo refinadíssimo, Sergio Leone explora com maestria recursos como diferentes profundidades de campo e os quatro pontos de fuga da tela. Causando o máximo de impacto possível no espectador, a obra explode no momento certo e se consagra como a maior ópera de violência (nas palavras do próprio diretor) da história do cinema. A trilha sonora é incrível, soando ao mesmo tempo melancólica e evocativa, sendo capaz de traduzir perfeitamente as tensões que afloram e as transformações em curso.

Poucas películas possuem uma quantidade tão grande de sequências antológicas como essa. Além da sequência de abertura, destacam-se a chacina da família irlandesa (ponto de partida para a trama), o plano sem cortes que mostra a chegada de Jill à Tombstone, o ataque de Cheyenne ao trem, a vila em construção... A fotografia acerta por situar todos os personagens na mesma realidade (leia-se: não representar mocinhos limpos e bandidos sujos e com roupas esfarrapadas). Além disso, o diretor de fotografia Tonino Delli Colli consegue valorizar cada rosto com seus closes, algo que nem sempre é atingido no cinema.


As atuações são nada menos que incríveis e memoráveis. Os olhos azuis de Henry Fonda formam um contraste sensacional com sua frieza e seu rosto envolto em sombras (destaque para a cena da chacina, em que um close magnífico contrapõe os dois elementos evidenciando os olhos do ator e a sombra produzida pelo chapéu). Cláudia Cardinale está linda como Jill McBain e basta um olhar de Charles Bronson para sabermos que aquela é uma pessoa a quem não se deve aborrecer.


Dos 165 minutos de projeção, existem 30 minutos de diálogo, no máximo. As falas são secas, curtas e sintéticas. Simplesmente fenomenais. Alguns podem, com razão, até taxar o filme de lento e arrastado, mas é indiscutível que foi construído com muito cuidado e suspense. Um fato interessante é que Leone não utilizou storyboards (algo impensável em Hollywood), alegando que todas as cenas já estavam construídas em sua mente.

Em meio a travellings, planos abertos seguidos de closes fechadíssimose uma violência operística e coreografada, vê-se o ápice de um realizador que, acima de tudo, tem estilo e linguagem apurados. Um filme para quem ama o cinema. Sem dúvida.


Por Bernardo Argollo

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sábado, 17 de novembro de 2012

Crítica: A Saga Crepúsculo | Amanhecer - Parte 2 (2012)













“Immortality becomes you.”

Título original: The Twilight Saga – Breaking Dawn Part 2. Dirigido por: Bill Condon. Produzido por: Wyck Godfrey, Karen Rosenfelt, Stephenie Meyer. Roteiro de: Melissa Rosenberg. Montado por: Virginia Katz. Fotografia de: Guillermo Navarro. Música de: Carter Burwell. Estrelando: Kristen Stewart, Robert Pattinson, Taylor Lautner, Mackenzie Foy, Billy Burke, Kellan Lutz.

Longe de ser tão pavoroso quanto os quatro longas anteriores, Amanhecer – Parte 2 conta, pelo menos, com uma história para contar e alguns novos e interessantes personagens. Assim, afasta-se do romance que era seu único e exclusivo foco. Chega a ser um bom filme, considerando-se que alguma qualidade é sempre melhor que qualidade nenhuma.

O roteiro, novamente escrito por Melissa Rosenberg, narra as consequencias de um mal-entendido que leva os Volturi (um tipo de realeza vampiresca) a acreditarem que os Cullen desrespeitaram uma antiga lei da espécie. Concomitantemente, acompanha-se os resultados da transformação da protagonista em vampira e do polêmico imprinting do lobisomem Jacob com Renesmee (que nome lindo, não é?), a filha do casal principal, concebida, inicialmente, com pobres efeitos visuais.

Contando com uma campanha publicitária copiada de franquias demasiado superiores, o filme acerta ao adotar um tom mais tenso e urgente. Uma transformação em vampiro nunca fez tão bem a alguém como fez a Bella. Deixando para trás seu semblante depressivo e sua postura apática (beirando o suicida), Bella torna-se uma figura mais digerível, enquanto explora suas novas capacidades e aprende a lidar com seu dom.

Mesmo que (finalmente!) o público tenha um enredo para acompanhar, ainda tem que encarar uma breguíssima cena de sexo entre Bella e Edward. Abusando de todos os clichês possíveis e imagináveis (como o uso da contraluz e de planos-detalhe exibindo mãos e coxas), a cena é a síntese do que realmente está levando milhões de adolescentes frenéticas ao cinema. Deve-se ressaltar, contudo, que nunca é tarde para evoluir um pouco. Desta vez, Jacob espera quinze minutos para tirar a camisa, ao invés dos quinze segundos do episódio anterior.

Alguns estereótipos preconceituosos trazem à tona a ignorância da incompetentíssima Stephenie Meyer em relação a outras culturas. Note que é sugerido, por exemplo, que os irlandeses são bêbados. E essa é só uma das insinuações do roteiro (copiadas, fielmente, do livro).

A produção surpreende positivamente com cenas cruéis, mostrando que os realizadores tem um mínimo de ousadia narrativa. Ainda assim, os cortes abruptos não deixam claro como o pequeno grupo reunido pelos Cullen foi capaz de subjugar o numeroso exército dos Volturi. O clímax é, sem dúvida, bem executado e funciona razoavelmente, mas evidencia a covardia e a obviedade da escritora e da roteirista ao simplesmente anular momentos importantes a fortíssimos. Além disso, deixa pontas soltas e simplesmente não resolve a trama.

É impossível escrever sobre Amanhecer – Parte 2 e não citar a impagável atuação de Michael Sheen como o vilão Aro. Apoiado numa construção extremamente caricata, o ator é incrível. Ele se diverte imensamente a cada cena, pouco se importando com o filme. Ele está claramente tirando sarro de todo mundo, tomando as decisões como ator que acha adequadas, completamente descomprometido com o entorno. É a melhor atuação de todo o filme.

Tropeços como o óbvio uso de Jasper e Alice como deus ex machina, como a falta de aprofundamento na própria mitologia (perdoável, afinal não se pode esperar mais de Meyer, não é mesmo?) e como a insistência em diálogos expositivos e melosos que jamais ajudaram a solidificar o romance do casal Bella e Edward não invalidam as boas decisões criativas e a direção consistente desenvolvida por Bill Condon nesse último capítulo. Cabe ao espectador decidir se vale a pena enfrentar quatro longas como os anteriores para chegar nesse, que, surpreendentemente, tem alguma qualidade.

Por Bernardo Argollo

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Crítica: E o Vento Levou (1939)













“As God is my witness, as God is my witness they're not going to lick me. I'm going to live through this and when it's all over, I'll never be hungry again. No, nor any of my folk. If I have to lie, steal, cheat or kill. As God is my witness, I'll never be hungry again.”

Título original: Gone with the Wind. Dirigido por: Victor Fleming, Sam Wood e George Cukor. Produzido por:  David O. Selznick. Roteiro de: Sidney Howard. Montado por: Hal C. Kern, James E. Newcom. Fotografia de: Ernest Haller, Lee Garmes. Música de: Max Steiner. Estrelando: Clark Gable, Vivien Leigh, Leslie Howard, Olivia de Havilland, Hattie McDaniel, Butterfly McQueen.

Passaram-se 73 anos. E mesmo os indivíduos de repertório mais limitado já ouviram falar de uma tal de Scarlett que, com Deus por sua testemunha, jurou que nunca mais passaria fome novamente. Hollywood sempre foi hábil ao criar produções que atinjam a todos os públicos, ultrapassando as barreiras do tempo, marcando gerações e maximizando os lucros.


Maior bilheteria da história (corrigida pela inflação), E o Vento Levou acompanha a jornada de Scarlett O’Hara (Vivien Leigh) e seus encontros e desencontros amorosos incluindo Ashley Wilkes (Leslie Howard) e Rhett Butler (Clark Gable). Quando estoura a Guerra Civil Americana (1861-1865), vê-se a desconstrução do universo da moça e sua posterior reconstrução, constituindo uma tocante história de superação. Tudo isso embalado por uma trilha sonora memorável.


Frequentemente exibido (com cortes) na programação noturna de emissoras, esse longa de quase quatro horas consegue, mesmo na contemporaneidade, manter o espectador atento. Ainda que excessivamente romântico, o roteiro acerta por articular personagens principais complexos com personagens secundários unidimensionais (ou seja, totalmente bons ou totalmente maus). O recurso é útil, pois torna a narrativa universal, atingindo ao máximo possível de espectadores e propondo discussões acerca das atitudes ambíguas das personagens centrais.

Há um cuidado admirável na concepção dos figurinos e cenários. Scarlett começa vestindo branco, logo no primeiro ato. Depois usa variadas cores, como verde e vermelho, simbolizando, respectivamente, esperança e pecado. E, finalmente, finda a narrativa de preto. Se o uso de tais cores tão explicitamente em situações-chave não soa sofisticado como linguagem, é louvável por explorar um recurso incipiente para a época (a cor).


O apuro técnico também pode ser sentido na cena do incêndio em Atlanta. Num período em que não havia CGI e sequer chroma key, os produtores não tiveram outra opção senão criar um verdadeiro incêndio. Matéria-prima? Os cenários de King Kong (1933). Mas é realmente lastimável que um filme desses tenha sido feito na era do cinema 4x3 (1.37:1). Em várias cenas, ele “grita” por uma razão de aspecto maior, obrigando os diretores a serem bem óbvios em suas composições de quadro enquanto poderiam ser mais sutis.

Outra característica que não sobreviveu ao avanço do cinema e da linguagem cinematográfica foi a estrutura de ópera em que E o Vento Levou se apóia. Com direito a overture, intermission, entr’acte e exit music. Talvez por ser mais adequada a apresentações não-projetáveis, tal construção soa, hoje, deslocada e desinteressante.

Em meio à trilha sonora evocativa e ao excesso de fade-outs, há um enfoque na questão da ligação do homem com a terra (com letra minúscula mesmo). Tais valores são endeusados pela obra, pois, afinal, a terra é a única coisa que restou para a personagem principal, é dela que ela deve tirar força para continuar vivendo. Assim, esse filme eterno passa sua mensagem há mais de sete décadas.


Por Bernardo Argollo

All the frames used here belong to Blu-ray.com and Warner Brothers.

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