terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

Crítica: Duna - Parte Dois (2024)

Dirigido por: Denis Villeneuve. Roteiro de: John Spaihts e Denis Villeneuve. Fotografia de: Greig Fraser. Estrelando: Timothée Chalamet, Zendaya, Rebecca Ferguson, Josh Brolin, Austin Butler, Florence Pugh, Dave Bautista, Christopher Walken, Léa Seydoux, Stellan Skarsgård, Javier Bardem e Anya Taylor-Joy.

Inacreditável pensar que se passaram quase três anos desde o primeiro Duna, comandado pelo diretor de A Chegada e Blade Runner 2049. Denis Villeneuve conseguiu o que era considerado praticamente impossível: fazer boas adaptações dos livros de Frank Herbert. Outros já tentaram (inclusive ninguém menos do que David Lynch), mas somente o franco-canadense acertou. Uma das boas decisões tomadas por ele foi justamente não condensar toda a vasta trama dos livros num único longa. Temos aqui, portanto, a segunda parte.

O roteiro continua a jornada do jovem Paul (Chalamet), espécie de messias arquetípico, agora membro dos Fremen. Tal grupo, cuja identidade visual remete à cultura árabe, luta por justiça contra um poderoso império (sim, George Lucas se inspirou em Duna). A cinematografia, assinada por Greig Fraser, consegue extrair beleza de cada um dos planos rodados no deserto, bem como mergulha cenas envolvendo certo casal numa onírica golden hour. A edição e mixagem de som estão entre as melhores que tive o privilégio de ouvir nos últimos anos. A trilha de Hans Zimmer, ao contrário da maioria dos trabalhos do compositor, soa orgânica, jamais intrusiva.

O projeto de Villeneuve consegue manter a escala épica sem se esquecer do aspecto intimista, ou mesmo de suas alegorias políticas (e religiosas). Nesta segunda parte, há menos tempo para desenvolver a mitologia, é verdade, mas há mais dedicação aos dilemas do protagonista. Antes uma figura distante, Paul agora é um guerreiro palpável, cujas emoções são expressas com intensidade (e sem pieguice) por Chalamet. Zendaya, por sua vez, ganha mais espaço para sua Chani, personagem que antes não passava de uma quase ponta. A Casa Harkonnen recebeu uma adição interessante na figura de Austin Butler, ator que conseguiu incutir algum peso dramático no vilão Feyd-Rautha, mesmo com relativamente pouco tempo de tela.

Tropeçando levemente ao introduzir figuras importantes já na segunda metade da projeção, o que geralmente representa um grave erro narrativo, o projeto de Villeneuve escancara um fato para o qual defensores de streamings insistem em fazer vista grossa. Ver um filme numa sala de cinema é uma necessidade incontornável para qualquer apreciador da Arte. Especialmente em grandes formatos, como IMAX, no qual assisti este filme a convite da Warner. É uma tristeza que um ser humano pense ter assistido a um longa-metragem... em seu telefone. Surreal.

Não ficarei surpreendido caso as obras comandadas por Villeneuve ocupem, ao lado de O Senhor dos Anéis e dos dois últimos Harry Potter, o lugar de adaptações definitivas de textos seminais. A saga de Frank Herbert, prestes a completar 60 anos, consolidou o gênero das space operas políticas e mantém-se mais atual do que nunca. Segundo o próprio cineasta, Duna não é somente entretenimento, é um aviso. Um aviso que nos soterra.

Por Bernardo Argollo

Agradecimentos: Espaço Z e Warner Bros.

sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

Crítica: Bob Marley - One Love (2024)

Dirigido por: Reinaldo Marcus Green. Roteiro de:
Terence Winter, Frank E. Flowers, Zach Baylin e Reinaldo Marcus Green. Fotografia de: Robert Elswit. Estrelando: 
Kingsley Ben-Adir, Lashana Lynch e James Norton.

Mais um diretor se rendeu ao famigerado subgênero das cinebiografias de músicos. Desta vez, o cineasta responsável pelo razoável King Richard decidiu comandar um projeto dedicado não a atletas, mas ao maior expoente do reggae. Ao contrário dos filmes de super-herói, os longas sobre trajetórias de celebridades estão em plena ascensão. Este ano, diga-se de passagem, teremos também uma produção sobre a Amy Winehouse, cuja vida já foi explorada em 2015 num documentário eficiente. Se a nova dramatização vai se debruçar de fato sobre as mazelas da artista (como o finado Pânico na TV fez de modo memorável), saberemos em breve.

Aqui, temos um roteiro escrito a oito mãos, as do próprio diretor e mais três colaboradores. Excesso de roteiristas nunca é bom sinal, já que, com certa frequência, a junção de sensibilidades diferentes para o mesmo filme resulta em falta de foco. Notório por sua filosofia de paz, amor e negligência com a própria saúde, Bob Marley representou um contraponto histórico à violência de seu país natal. A narrativa adota a tentativa de homicídio sofrida pelo cantor em 1976 como ponto de partida. Em meio a preocupações com a própria segurança na Jamaica, o artista se muda para Londres, onde gravou o álbum Exodus, o mais bem-sucedido de sua carreira.

O longa aposta numa estrutura pouco inspirada, construída de maneira episódica, intercalando sequências com flashbacks oníricos pouco significativos e, portanto, descartáveis. E sou capaz de apostar que esses inserts foram adicionados posteriormente, após os produtores (ou executivos do estúdio) decidirem que faltava "um elemento fantástico" ao longa. Outro ponto fraco é a atuação de Ben-Adir, intérprete habitualmente razoável, mas que aqui atua no piloto automático, deixando que a voz mansa, os dreadlocks e o forte sotaque jamaicano façam todo o trabalho de estruturação do personagem. Lashana Lynch, no entanto, está bastante respeitável como Rita, esposa do cantor. Provavelmente, ela é a única figura capaz de gerar algum engajamento no espectador.

O ponto mais lamentável deste projeto é o fato de ter deixado de fora o que talvez tenha sido o momento mais importante da vida do astro (deixarei que vocês o identifiquem por si mesmos). A passagem é citada, sim, mas quase que como uma nota de rodapé, nos inevitáveis letreiros finais que são uma verdadeira praga nesse tipo de filme. Além de tentar dar passos maiores que as pernas, Green finaliza sua produção num ponto totalmente arbitrário. One Love até flerta com a complexidade, mas se contenta em ser um simples hero worship. Ao contrário de Marley, este filme pode ser tudo, menos notável.

Por Bernardo Argollo

Agradecimentos: Espaço Z e Paramount Pictures.

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