sábado, 6 de dezembro de 2014

Crítica: Spring Breakers (2012)

















Dirigido por: Harmony Korine. Roteiro de: Harmony Korine. Estrelando: Vanessa Hudgens, Selena Gomez, Ashley Benson, James Franco.

Mais do que um projeto ousado feito sob medida para mostrar que princesas Disney já não são tão princesas assim, este Spring Breakers é uma agradável surpresa, trazendo uma estética que, se não original, serve muito bem aos propósitos da narrativa.

Iniciado com longos planos em câmera lenta que, em meio a uma trilha pulsante, e com uma fotografia devidamente saturada, situam o espectador no local onde se desenrolará toda a libertinagem que constitui a famosa semana onde vale tudo para os estudantes americanos. O roteiro acompanha a jornada de quatro garotas, vividas por Selena Gomez, Vanessa Hudgens, Rachel Korine e Ashley Benson. Por não possuírem recursos financeiros para ir ao Spring Break, as meninas resolvem assaltar uma lanchonete para angariar fundos, num criativo plano-sequência. Tendo seu projeto bem sucedido, elas embarcam para uma jornada de sexo, drogas e criminalidade.

A incrível fotografia de Benoît Debie nunca é gratuita, investindo sempre em pistas visuais sobre aquilo que acontecerá a seguir. Na sala de aula vista no início da projeção, apropriadamente mergulhada em sombras, vemos os tons neon/cítricos que remetem ao Spring Break. Acertando imensamente ao compor a faculdade como um ambiente onde o cinza drenou todas as cores (algo que se repetirá na prisão, após a festa), Debie ressalta ainda mais a fascinação que a comemoração desregrada exerce nas jovens, que os realizadores infantilizam através de detalhes sutis como as bolsas de pelúcia e falas ingênuas (“é a nossa chance de ver algo diferente”).

O longa ainda encontra tempo para criar metáforas inesperadas, como na cena em que as garotas se banham em uma fonte, numa tentativa patética de purificação para entrar de corpo e alma na comemoração, ao mesmo tempo em que fortes luzes vermelhas denunciam o perigo e a culpa inerente às suas atividades, num momento que flerta divertidamente com a lógica visual de Os Bons Companheiros. Tomando o cuidado de não julgar as atitudes de suas personagens, o diretor Harmony Korine conduz a narrativa com segurança, usando imagens semelhantes a gravações de arquivo no segundo ato, contrapondo-se inteligentemente ao ar intimista do primeiro, que com a câmera sempre próxima ao rosto das moças, ilustra organicamente o quanto o entorno as sufoca.

O desenho de som é simplesmente impecável, sem chamar muita atenção para si mesmo, ao passo que contribui muito para estabelecer ideias sem recorrer a diálogos. Destaque para o som de tiro que aparece desde o início, compondo uma criativa rima sonora e alertando o espectador que, inevitavelmente, algo não vai dar certo. E não deu.

Donas de uma ingenuidade irritante e diretamente proporcional à sua disposição em transgredir, as garotas acabam detidas e são “resgatadas” pelo mafioso Alien, numa performance magistral de James Franco. A partir de então, os realizadores são hábeis ao retratar o desconforto crescente de Faith (Gomez) a partir da mise-en-scène e de sua posição progressivamente à esquerda e abaixo do centro nos quadros.

Não caindo no erro comum de justificar ou relativizar as atividades ilegais de Alien, o roteiro e a atuação de Franco o transformam em nada menos que um personagem perigoso, assustador e absolutamente frágil. Dono de uma sensibilidade que ninguém esperaria de uma figura como ele, o gangster/rapper/traficante faz referência ao icônico Scarface com a mesma facilidade com que, numa cena belíssima (e sem medo de ser brega), canta a música Everytime, de Britney Spears. Esse momento representa o amadurecimento no mundo do crime por parte de Brit (Benson), Candy (Hudgens) e Cotty (Korine), rimando perfeitamente com a cena em que, num momento de descontração e infantilidade absolutas, outra música da mesma artista é cantada, a boba Baby One More Time.

Não que o longa não tenha sua parcela de problema, é claro. Algumas situações são difíceis de aceitar, soando absurdamente inverossímeis, mesmo naquele universo totalmente deturpado. O roteiro jamais se preocupa em esclarecer, por exemplo, o real motivo de Alien ter pagado a fiança das garotas, sendo que nunca as tinha visto antes (e havia inúmeras outras na mesma situação). Mas tudo isso empalidece, por exemplo, diante da mansão banhada por luzes roxas (morte) vista no terceiro ato. Ah, Spring Breakers... Você fez a lição de casa.


Por Bernardo Argollo

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