quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Crítica: Holy Motors (2012)













Dirigido por: Leos Carax. Produzido por: Martine Marignac, Albert Prévost, Maurice Tinchant. Roteiro de: Leos Carax. Estrelando: Denis Lavant, Édith Scob, Eva Mendes.

Reverenciando o Cinema por aquilo que faz dele uma arte, a reprodução mecânica, o cineasta francês Leos Carax declara seu amor a Sétima Arte e ressente-se pelo seu estado atual. Intenso e intrincado, o projeto parece suscitar naqueles que o assistem o desejo incessante de decifrá-lo, ler suas entrelinhas e entender suas idéias mais sutis. Mais do que um exercício narrativo extremamente satisfatório, Holy Motors é um profundo estudo sobre o ato de se representar a vida na arte.

O roteiro acompanha um dia de trabalho do Sr. Oscar (Lavant) e as estranhas situações que vive. Circulando por Paris numa luxuosa limusine comandada pela belíssima Celine (Scob), Oscar assume diferentes identidades. A natureza de sua profissão nunca é explicada, portanto, o espectador fica a imaginar a lógica daquele universo (mais sobre isso daqui a pouco), intrigado por figuras como uma mendiga, um assassino, um pai ressentido, um ancião no leito de morte, entre outros.

Contando com um prólogo muito simbólico, que mostra o próprio Carax saindo da cama e caminhando em direção a uma das paredes de seu quarto, forrada com um papel de parede que remete a uma floresta. Assim, seu dedo médio revela-se uma chave, e a porta que se abre dá em um cinema no qual todos os espectadores dormem, uma clara metáfora para o perfil do público atual, que se contenta com produções vazias. Dessa forma, fica claro que o foco do longa é justamente a experiência de mergulhar em um filme.


Lamentando a artificialidade do Cinema contemporâneo, o roteiro não se intimida ao trazer seu protagonista visitando uma verdadeira indústria de motion capture, que expõe o caráter industrial de muitos projetos. Repleto de elementos surrealistas e mensagens subliminares, Holy Motors comenta a profissão do ator, que salta de um personagem a outro enquanto reflete sobre sua própria existência, e Lavant ilustra isso com maestria ao criar um eficiente arco dramático para seu personagem, que vai ficando progressivamente cansado e frustrado.


Devolvendo o poder de mistério às imagens, que muito perderam sua capacidade de sugerir à medida que foram ficando ao alcance de todos, o projeto traz várias referência a clássicos do cinema francês. As referências aqui são como lembranças vagas, como no momento que traz, no desfecho da projeção, Édith Scob usando uma máscara que remete à Os Olhos Sem Rosto, filme que protagonizou. O longa ainda encontra tempo para lamentar a morte do celuloide e sua substituição gradativa pelo digital, e não é coincidência que a Kodak tenha pedido falência justamente em 2012.

Há, em Holy Motors, musical, ficção científica, tramas de assassinato... E se as lápides com inscrições de “visite meu website” já soam bastante distópicas, o que dizer da modelo cujas vestes se convertem numa burca? Outro bom momento é a aparição da cantora australiana Kylie Minogue. Se antes seu maior hit é utilizado como epíteto da imaturidade em uma certa cena, na sequência a vemos interpretando o maior clichê dos filmes musicais: uma canção emotiva em resposta a uma pergunta. A passagem é uma clara crítica às fórmulas prontas e tem um trágico desfecho.

Aberto a diversas interpretações e aplaudido de pé durante quinze minutos no Festival de Cannes em 2012, o projeto é também sobre a mis-en-scène, o ato de dispor elementos em cena e criar algo crível. Em certa altura, o protagonista, dono de uma expressão corporal irretocável e cujo próprio nome representa a aspiração máxima de todos que atuam no cinema, resume: só a “beleza do gesto” é suficiente. Assim, Holy Motors se revela descomplicado, como um país das maravilhas no qual podemos viver o que quisermos, filme após filme.


Por Bernardo Argollo

The frames used here belong to Blu-ray.com and Les Films du Losange.

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