quarta-feira, 18 de julho de 2012

Crítica: Melancolia (2011)


"The earth is evil. We don't need to grieve for it."

Título original: Melancholia. Dirigido por: Lars von Trier. Produzido por: Meta Louise Foldager, Louise Vesth. Roteiro de: Lars Von Trier. Montado por: Molly Malene. Fotografia de: Manuel Alberto Claro. Estrelando: Kirsten Dunst, Charlotte Gainsbourg, Alexander Skarsgård e Kiefer Sutherland.

Ao incorporar elementos do movimento Dogma 95 sem se ater excessivamente às suas regras rígidas e um tanto esdrúxulas, o cineasta dinamarquês Lars von Trier nos presenteia com um dos melhores filmes da década. Melancolia é uma história tocante, profunda, humana e desconcertante.

Ambientada num exuberante castelo sueco (mas de localização não citada na narrativa atemporal), a trama começa inserida no casamento de Justine, uma publicitária bem-sucedida acometida pela depressão. Em contrapartida, sua irmã Claire é uma mulher segura, calma e aparentemente feliz. Quando é anunciado que o planeta Melancolia vai colidir com a Terra, acompanhamos a desconstrução dos mundos divergentes de Justine e Claire, da maneira mais humana e poética possível.


Na primeira parte, centrada em Justine, Kirsten Dunst oferece uma atuação incrível, retratando uma pessoa depressiva com extrema sensibilidade e cuidado. É chocante notar, em seu casamento, que em meio a incessantes sorrisos, ela parece ter sempre uma lágrima pronta para brotar. Isso fica bem marcado na cena em que Justine se defende dos conselhos de sua irmã (temerosa de uma recaída).




Cercado de metáforas e construções simbólicas, com destaque para as que permeiam o irretocável prólogo (que se desenvolve quase que como um sonho), o roteiro é hábil ao desenvolver plenamente seus personagens. Quando os problemas de Justine chegam ao ápice, pois até sua comida preferida perdeu o sabor e ela não consegue nem mesmo banhar-se, o primeiro ato termina e o segundo tem início. Na transição entre os dois, nota-se que o cavalo de Justine não consegue transpor uma simples ponte, simbolizando a impossibilidade da personagem em ultrapassar obstáculos simples para todos os outros.

Voltada para Claire (interpretada pela genial Charlotte Gainsbourg), a segunda parte foca no seu desespero e na destruição de seu universo particular com a aproximação e colisão com o planeta. Enquanto isso, Justine apresenta-se extremamente tranquila e aliviada, reconstruindo sua existência gradativamente e aceitando com muita paz e serenidade o destino de todos, abraçando o astro e tornando-se parte dele, deixando que ele a invada, a conquiste. Recebendo-o de braços abertos, sem medo ou temor, deitando-se nua em frente ao corpo celeste, chocando Claire, e ao mesmo tempo deixando as questões mundanas para trás. Contemplando Melancolia lado a lado com a lua, numa cena de tirar o fôlego.


Dessa forma, Claire não aceita a situação e fica completamente perdida, incapaz de compreender, por exemplo, porque um dos funcionários do castelo foi esperar a chegada do planeta junto com sua família. Ela teme pelo seu filho, pelo seu marido, pela sua vida e pela Terra e a vida que existe nela.


O roteiro frisa, na figura de John, o pragmático marido de Claire, a presença de dezoito buracos no campo de golfe. Perto da conclusão da narrativa, podemos ver uma bandeira sinalizando o décimo nono buraco. Com essa metáfora, von Trier escancara a imprevisibilidade da existência humana, a inconstância e inconsistência da vida na Terra ou em qualquer parte do cosmos, afinal, “a terra é má... A vida está apenas nela. E não por muito tempo.”

Contando com um roteiro bem amarrado, o filme permite múltiplas interpretações, considerando que uma obra existe independentemente de seu criador. Acredito que o cinema poucas vezes retratou os desesperos humanos de maneira tão fluida e orgânica, sob a forma de um planeta que se aproxima implacavelmente e colide com o nosso, absorvendo-nos... Ainda que tenha vários erros de continuidade, o filme funciona de maneira sensacional. É interessantíssimo perceber que, mesmo sendo um diretor pessimista (vide sua abordagem em Anticristo e Dogville), Lars von Trier mostra que podemos, sim, encontrar tranqüilidade até nas situações mais improváveis.


Por Bernardo Argollo

Crédito dos frames: Site Blu-ray.com (www.blu-ray.com)

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