“When Gotham is ashes, you have my permission to die.”
Título
original: The Dark Knight Rises. Dirigido por: Christopher Nolan. Produzido
por: Emma Thomas, Christopher Nolan, Charles Roven. Roteiro de: Jonathan Nolan
e Christopher Nolan. Montado por: Lee Smith. Fotografia de: Wally Pfister. Estrelando:
Christian Bale, Michael Cane, Anne Hathaway, Tom Hardy, Marion Cotillard,
Joseph Gordon-Levitt, Morgan Freeman.
Em um encerramento digno
para uma saga madura e ambiciosa, Christopher Nolan ratifica-se como um dos grandes
diretores da contemporaneidade. Sua abordagem é adulta, verossímil e
emocionante, sendo infinitamente mais interessante que o tom caricato adotado
por Tim Burton. A envolvente narrativa tem falhas óbvias, fruto do excesso de
pontas soltas dos filmes anteriores e de subtramas para resolver. Tais
deslizes, contudo, não tiram o brilhantismo da fita e do seu formindável
diretor.
Antes de dissertar de fato,
devo observar que foi um alívio assistir à projeção em 35 mm (já que,
infelizmente, não existem salas IMAX no meu estado). Em meio às terríveis
projeções digitais que se espalham (não tenho nada contra, mas é necessária uma
resolução maior que 4K para substituir a película), é gratificante perceber que
existe um diretor consciente de que a melhor experiência cinematográfica ainda
é a película. Exceto para produções em 3D, quando muitas vezes questões
financeiras inviabilizam a sincronização de dois projetores e soluções digitais
fazem-se necessárias, substituir a película sem prejuízos ainda é algo
complicado.
Já feitos os comentários
técnicos, vamos à crítica propriamente dita. A trama tem início oito anos após
os acontecimentos vistos no longa anterior, quando a morte de Harvey Dent
(atribuída a Batman) induz à criação de uma lei que inibe a criminalidade em
Gotham. É nesse panorama que Bruce Wayne está imerso, tendo que reassumir seu
alter-ego depois que a presença de Bane e de seu exército subterrâneo é
revelada. Diversas subtramas e personagens secundários estão presentes, como a
mulher-gato Selina Kyle (Hathaway), o jovem policial Blake (Gordon-Levitt) e a
milionária (e, mais tarde, vilã) Miranda Tate.
Numa eletrizante sequência
de ação logo nos primeiros minutos, somos apresentados ao terrorista Bane,
brilhantemente interpretado por Tom Hardy. O ator apresenta uma composição
vocal e uma imponência física notáveis. A voz profunda e hipnotizante do
personagem é eficaz e necessária, já que seu rosto está sempre coberto por uma
máscara (cuja função é liberar analgésicos para que ele possa suportar as
horríveis dores de seus ferimentos). Dono de um discurso populista, o vilão é
realmente uma figura assustadora. É interessante salientar, todavia, que bastou
um close e um olhar no terceiro ato para que esta construção se inverta e, por
um momento que seja, sintamos compaixão.
Christian Bale mais uma vez
está sensacional como Bruce Wayne, com as transformações físicas que ele
realiza para se adequar aos personagens sempre merecendo aplausos, soando
convincentes e competentes. Destaque para a voz enrouquecida adotada por ele
quando encarna o homem-morcego, usada mesmo quando se comunica com aqueles que
conhecem sua identidade secreta, numa atitude que beira a esquizofrenia. Anne
Hathaway atua de forma sedutora e atraente como a ladra Selina, e não posso
deixar de mencionar a qualidade técnica dos planos em que ela pilota a moto do
Batman. A boa atuação de Marion Cotillard como Miranda Tate é deveras
prejudicada pelas suas falas um tanto operísticas.
O diretor é hábil ao criar e
manter a tensão, intensificada pela ótima trilha sonora de Hans Zimmer. A
paleta de cores escurecida e verossímil torna a fotografia sombria,
contribuindo para tornar o filme um dos mais adultos de seu gênero. Ainda
assim, é decepcionante constatar que, mesmo com toda sua liberdade criativa,
Nolan e sua trupe tiveram a preocupação puramente mercadológica de que o filme
não recebesse um R nos Estados Unidos. Na cena em que a polícia confronta o
exército de Bane no terceiro ato, fica clara a intenção de manter o PG-13.
Enquanto outro cineasta não
pensaria duas vezes antes de usar CGI para compor muitas das cenas, Christopher
Nolan opta por efeitos mecânicos muito mais naturais e convincentes, algo
recorrente em sua filmografia. A sequência dos aviões, logo no início da
projeção, não foi feita por computação gráfica em sua maior parte.
Algo comum em terceiros
capítulos de trilogia, a grande quantidade de personagens e subtramas acabam
levando a furos no roteiro. Como é possível que Bruce retorne rapidamente a
Gotham, teoricamente sem um centavo no bolso? Essas e outras falhas chamam a
atenção do espectador experiente.
O final não é ambíguo como o
de A Origem (2010), mas não deixa de
dar margem a variadas interpretações. Tal afirmação deve-se ao fato de Alfred
não ter ido cumprimentar Selina e Bruce, e destes estarem com roupas
completamente diferentes do que costumam usar. Mesmo assim, o ex-mordomo
poderia estar apenas sendo discreto (já satisfeito com a visão que tivera) e as
roupas poderiam apenas estar simbolizando o novo momento de vida dos
personagens. Se Alfred imaginou ou não, cabe ao espectador usar seu referente
para decidir. É certo, porém, que o final é muito conveniente para a Warner
Brothers, mesmo sendo o último projeto da franquia dirigido por Nolan.
A película prova, entre
outras coisas, que é possível realizar algo sério, inteligente e rico em idéias
baseando-se em histórias em quadrinhos. Caso tal procedimento torne-se
tendência, só quem ganha é o espectador, que poderá refletir sobre sua
realidade e abandonar os filmes visualmente arrebatadores e vazios de conteúdo
que permeiam o cinema contemporâneo.
Por Bernardo Argollo
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