Dirigido por: Todd Haynes. Roteiro de: Samy Burch. Fotografia de: Christopher Blauvelt. Estrelando: Julianne Moore, Natalie Portman e Charles Melton.
Todd Haynes, diretor do aclamado Carol (2015), é um dos raros cineastas do new queer cinema que conseguiu migrar para o mainstream. Ousado, sem nunca soar vulgar, Haynes aqui decide explorar temas ainda mais delicados, como pedofilia e aliciamento de menores. Por motivos óbvios, escândalos íntimos possuem apelo quase universal, e o filme não só compreende isso como consegue a proeza de mergulhar numa história desconfortável sem causar grande repulsa no público.
A narrativa acompanha a atriz Elizabeth (Portman), escalada para interpretar Gracie, mulher que, há vinte anos, se envolveu com um garoto de 13 anos (ela tinha 36). O "romance" culminou com a prisão da abusadora, que não apenas engravidou do garoto mas, cumprida sua pena, manteve o relacionamento. Agora legalmente casados e com três filhos, Gracie e Joe (Melton) veem sua rotina perturbada pela presença da artista, que vai conhecê-los como parte da preparação para interpretá-la no filme independente (claro).
É interessante observar o modo como Elizabeth, moça de modos contidos e voz vacilante, passa a absorver paulatinamente a linguagem corporal de Gracie, cuja fachada de autoridade esconde a própria insegurança. A atuação de Moore, acertadamente, sugere camadas sem nunca revelá-las de fato. A mulher, agora de meia-idade, parece sempre ter uma lágrima escondida no canto do olho e um rancor a espreitar cada sorriso. Assombrada pelo horror que cometeu, ela se esforça para manter a aparência de mãe saída de comercial de margarina, mas na primeira oportunidade trata seu cônjuge como se fosse um filho (o que não é exatamente uma surpresa, diga-se de passagem).
Haynes ilustra tal processo de maneira interessante, com Elizabeth à esquerda do quadro e, depois da desestabilização do núcleo familiar pela sua presença, a jovem passa a ocupar a porção direita dos enquadramentos. Comprometida com o próprio trabalho e genuinamente interessada em explorar o ser por trás de sua futura personagem, ela permeia o passado de Gracie por meio de depoimentos de filhos, do advogado, do ex-marido e, claro, das interações com a própria. O esposo (ou melhor, vítima) de Gracie é vivido aqui por Charles Melton (sim, aquele ator de televisão), um intérprete limitado, mas que consegue incutir em Joe o choque causado pelo abandono do ideal romântico e percepção do horror de sua própria existência.
O real motivo do abuso e da manutenção do relacionamento entre as partes, só podemos especular. Com ritmo agradável, o longa toma seu tempo sem jamais soar enfadonho, o que não é tão fácil de fazer quanto parece. Segredos de um Escândalo termina numa nota pungente, daquelas que deixam os espectadores incertos sobre a real natureza do que testemunharam. O maior mérito aqui, no entanto, talvez seja o fato de não pretender dar respostas simples para perguntas complexas (exatamente o que prejudicou esse filme). Mais um trabalho relevante na filmografia de Todd Haynes, o projeto é uma grande aposta para a temporada de premiações.
Por Bernardo Argollo
Agradecimentos: Espaço Z e Diamond Films.
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